(Ler ouvindo Flávia Bittencourt- Mar de Rosas)
Eu preciso falar a verdade. Eu não te amo. Eu não sei se te
amei em algum momento. É bom, é gostoso, a gente é feliz, se entende, se
completa, se aceita, mas não, a gente não se ama. E não espero que você entenda
minhas palavras. Não existe amor. É superficial, é vazio. Te escrevo isso
chorando, me perdoa. Estamos perto do fim, cansados, essa rotina enjoada, o
peso desse costume de ser dois nos ombros, a convivência por um bem maior, um
bem social. O social que você tanto preza. Eu estou cansada, querido, não quero
sair. Mas não podemos deixar de ir, se arrume, estão todos nos esperando e
desamarre essa cara, não quero que pensem que não estamos bem. A vontade de
mandar todos seus amigos falidos pra Júpiter. De gritar bem alto no meio de uma
daquelas histórias ridículas do seu tio. Avisar sua mãe que ninguém mais
agüenta ver aquelas fotos das férias em São Luiz.
Te chacoalhar e dizer com todas as letras: PARE. Chega de “eu
te amo” na frente dos outros. Não me mande flores, pra depois contar pros seus
amigos, se gabando de como fiquei emocionada. Fotos e presentes e jantares
caros não são provas e muito menos sinais de amor. São exatamente o oposto. Nós
somos o exemplo mais puro e simples do engano. Somos a mentira mais bonita do
mundo. Só que eu não agüento mais, eu preciso viver mais inside, ser feliz só em
out está me matando. Talvez amanhã ou depois, eu melhore. Talvez eu volte a
sorrir quando toda a corja dos seus amigos de trabalho invadirem nossa casa,
pra jantar. Talvez eu volte a gostar do seu exibicionismo. Talvez eu te perdoe,
por amar tanto a todos, mas esquecer de amar a mim. Mas talvez eu me mude. Vá
pra Roma, estudar História da Arte, como eu digo que quero todos os anos e você
ignora. Talvez eu suma e você só se dê conta, quando achar meu armário vazio.
Talvez eu comece a gritar, louca pela casa, falando sobre todos os detalhes que
eu amo tanto e você não repara. Talvez você nunca leia isso. Talvez você leia
amanhã. Talvez eu volte pra casa da minha mãe. Eu estou disposta a tudo. Eu só
não aceito admitir que isso é amor. Porque se isso for amor, eu quero meu
dinheiro de volta, eu fui enganada, eu não brinco mais, eu vou no PROCON, eu
quero indenização milionária, eu desisto. O amor que eu acreditava, era longe
de ser o que nós vivemos. O amor é divino demais, pra essa vida profana. Se o
amor é óleo, nós somos água.