terça-feira, 24 de julho de 2012

A verdade.



                   (Ler ouvindo Flávia Bittencourt- Mar de Rosas)

Eu preciso falar a verdade. Eu não te amo. Eu não sei se te amei em algum momento. É bom, é gostoso, a gente é feliz, se entende, se completa, se aceita, mas não, a gente não se ama. E não espero que você entenda minhas palavras. Não existe amor. É superficial, é vazio. Te escrevo isso chorando, me perdoa. Estamos perto do fim, cansados, essa rotina enjoada, o peso desse costume de ser dois nos ombros, a convivência por um bem maior, um bem social. O social que você tanto preza. Eu estou cansada, querido, não quero sair. Mas não podemos deixar de ir, se arrume, estão todos nos esperando e desamarre essa cara, não quero que pensem que não estamos bem. A vontade de mandar todos seus amigos falidos pra Júpiter. De gritar bem alto no meio de uma daquelas histórias ridículas do seu tio. Avisar sua mãe que ninguém mais agüenta ver aquelas fotos das férias em São Luiz. Te chacoalhar e dizer com todas as letras: PARE. Chega de “eu te amo” na frente dos outros. Não me mande flores, pra depois contar pros seus amigos, se gabando de como fiquei emocionada. Fotos e presentes e jantares caros não são provas e muito menos sinais de amor. São exatamente o oposto. Nós somos o exemplo mais puro e simples do engano. Somos a mentira mais bonita do mundo. Só que eu não agüento mais, eu preciso viver mais inside, ser feliz só em out está me matando. Talvez amanhã ou depois, eu melhore. Talvez eu volte a sorrir quando toda a corja dos seus amigos de trabalho invadirem nossa casa, pra jantar. Talvez eu volte a gostar do seu exibicionismo. Talvez eu te perdoe, por amar tanto a todos, mas esquecer de amar a mim. Mas talvez eu me mude. Vá pra Roma, estudar História da Arte, como eu digo que quero todos os anos e você ignora. Talvez eu suma e você só se dê conta, quando achar meu armário vazio. Talvez eu comece a gritar, louca pela casa, falando sobre todos os detalhes que eu amo tanto e você não repara. Talvez você nunca leia isso. Talvez você leia amanhã. Talvez eu volte pra casa da minha mãe. Eu estou disposta a tudo. Eu só não aceito admitir que isso é amor. Porque se isso for amor, eu quero meu dinheiro de volta, eu fui enganada, eu não brinco mais, eu vou no PROCON, eu quero indenização milionária, eu desisto. O amor que eu acreditava, era longe de ser o que nós vivemos. O amor é divino demais, pra essa vida profana. Se o amor é óleo, nós somos água.

sexta-feira, 13 de julho de 2012

Ao meu grande amor.




(Ler ouvindo Maria Gadu - Tudo Diferente)

Quero que me desculpe por não te enviar de fato essa carta, mas a verdade é que não sei seu nome, nem seu endereço. Nem ao menos sei se você existe, de fato. Mas eu que quero muito, que você exista. E algo dentro de mim, diz que você não tá longe, que você não demora a chegar. E que seja assim, como vou te pedir agora. Não demore muito pra vir, e pode chegar do jeito que quiser, vou te reconhecer. Só sorria. Pode me perguntas as horas, pode ser meu garçom e me indicar o prato especial da casa. Pode ser meu vizinho, pode aparecer sem querer e sentar ao meu lado num bar. Mas sorria. Sorria e me faça te olhar. Não tenha medo desse meu jeito de falar demais, nem da minha expressão de tédio. Não se impressione com meus amigos, nem se assuste com minha família. Não fale alto demais, mas me faça te ouvir. Prenda esses oitenta braços que eu tenho, que vivem puxando e empurrando as pessoas o tempo todo. Não tenha medo de mim, por favor. Seja mais alto que eu e use um perfume bem cheiroso. Aqueles que deixam qualquer homem com jeito de mais homem. Seja bem homem. Mas saiba comer. Use garfo e faca, sem precisar por o dedo no prato, pra empurrar o pedaço de carne. Pode gostar de qualquer tipo de música, contanto que me ensine a gostar também. Isso também é importante, me ensine todo tipo de coisa. E pode ser simpático, mas não muito. Compre flores de vez em quando, pra eu acreditar que você é um príncipe. Esconda as meias sujas, quando eu visitar sua casa. Faça amor comigo. Sem me pedir pra virar as pernas pra cá ou lá. Só faça amor. De qualquer jeito. Tenha uma profissão bem esquisita. Saiba jogar xadrez. Goste de futebol, mas não seja fanático. Respeite meu espaço, meu banheiro e a forma que organizo meus cremes na prateleira do box. Pode ser ciumento, mas não daquele tipo possessivo. Seja amigo do meu pai. Não me ache louca nem estranha quando eu chorar, no meio de um temporal. Goste de mim, mesmo de pantufas. Pode ser meio esquisito e cantar mal, pode ter uma família estranha, pode odiar comida japonesa, pode ser meio excêntrico, meio over. Mas me conheça, não tenha medo de ouvir as barbaridades que vou te contar, nem da minha capacidade de ler as entrelinhas de tudo que você disser. Seja meu, simples, bom, tranqüilo. Seja como um grande amor deve ser. Ou então, esqueça tudo que eu já disse e simplesmente seja real. Não precisa mais nada. Só exista.

segunda-feira, 2 de julho de 2012

Apresentação.


(Ler ouvindo Zeca Baleiro - Quase Nada)


Olha, eu sei que você não me conhece, mas isso é normal, pouca gente conhece de verdade, vou me apresentar e depois que eu disser tudo, você decide se realmente vai me entregar seu coração assim, tão de bandeja. Depois que eu falar tudo, você me diz se eu valho todo esse brilho nos seus olhos. Eu não te culpo por gostar de mim, sou mesmo fácil de se apegar. Sempre fui, desse jeito assim, meio louca, meio intensa demais. Sempre fui. Chorar com comédia, fazer piada de tragédia. É meu jeito de fugir da vida, é meu jeito de ser lúcida apesar da vontade imensa de me entregar a ignorância. Eu fujo da vida batendo de frente com ela. Eu sempre quis ser lembrada. Acho que não só eu, todo mundo no fundo, é assim. Todo mundo quer ser lembrado. Agora, daqui a pouco, daqui vinte anos. Não existe quem não fique feliz quando alguém se lembra seu nome ou algo que fez. O ser humano tem necessidade de deixar seu legado. Mas a maioria das pessoas finge que isso não importa, finge que o importante é ter amigos, é ser feliz. Mas não, o importante é o que vai ficar. Não tem problema se depois dessa conversa, você decidir que não me ama, eu só quero que não se esqueça de mim. Por qualquer motivo. Eu acho que fazer história é mais importante que viver. Fazer história é não morrer nunca. Enquanto alguém lembrar, você existe. Eu não sou muito fácil de conviver, costumo reclamar bastante de tudo, de qualquer coisa. E mesmo que o céu esteja caindo sobre as nossas cabeças, não vai ser difícil me ver sorrindo. Eu sempre sorri demais. E acho que é um dos meus grandes problemas e grandes virtudes. Eu não sofro nenhuma dor que seja minha. Minha dor é a dos outros. Sou capaz de chorar horas contínuas por algo que nunca me aconteceu, mas não choro a morte de alguém próximo. Tem gente que acha que eu brinco com as pessoas, mal eles sabem que eu brinco é comigo. Eu brinco com essa minha alma grande demais prum corpo tão pequeno, brinco com minha necessidade de amar demais e ser demais e querer demais, eu brinco é com a falta que todo o universo faz dentro de mim. Eu quero que você me ame pra sempre, mesmo que eu não te ame e isso não é por mal, é apenas um desejo. Eu sou uma esponja que nunca se encharca. O tudo pra mim é pouco. O infinito acaba ali na esquina. E não tem problema se acabar amanhã, eu vou embora sorrindo. Eu sempre vou embora, de todos os lugares. E eu sempre deixo uma marca onde eu passo. Eu sou demais pra mim. E sou demais pra você também e é por isso que não vamos dar certo. Sou demais pra qualquer pessoa. Mas voltando a sua pergunta... 


Meu nome é Thais.


terça-feira, 19 de junho de 2012

Conversa Íntima.



( Ler ouvindo Leoni - Temporada das Flores)


Hoje eu acordei bem. Um pouco atrasada, como sempre, mas bem. Tranquila, sem peso, sem pensamento longe. Acordei aqui. Decidi ir trabalhar de ônibus, tenho essa mania as vezes, gosto de observar as pessoas. Dei bom dia ao motorista. Sorri pruma senhora, sentada ao lado. Cheguei ao trabalho, tratei os clientes melhor que o normal. Fiz compras, conversei, tomei um suco naquela cantina incrível que abriu lá no centro. Cantarolei pela rua. Fui prum barzinho, happy hour com os amigos. Cheguei em casa, li algumas páginas de um livro que ganhei. Sentei na cama, notebook no colo. Ok Thais, vamos escrever. Sofra, chore, mostre a agonia nas palavras, do jeito que todo mundo adora. Mas cadê? Cadê o sofrimento, menina? Eu não sei. Thais você precisa sofrer. Eu sei que preciso, mas não é assim tão simples... As coisas vão bem, eu estou feliz. Você não pode ficar feliz, você não tem o que escrever feliz, você precisa de sofrimento, cadê aquele seu ex do cabelo jogadinho, que te fazia morrer de tanto chorar? Não sei dele... Faz um tempão que não tenho notícias. Então tá na hora de ir procurar, tomara que ele esteja namorando, ai rola um texto bem dor de cotovelo. Ah tomara que esteja, ele queria mesmo um relacionamento assim, eu que não estava pronta. Ei, como assim, não não não não, a culpa não é sua, foi dele, a culpa é dele, é sempre dele. Não, ele era legal. Ah meu Deus, e aquele outro? O de vez em quando... Ele rendia um textos incríveis, vamos falar dele, tá com saudade? Não... Apaguei o número dele há algumas semanas. Você precisa sofrer, então dê um jeito agora Thais Cinotti, agora. Todo mundo tem uma consciência chata igual você? Não, só as escritoras sofredoras. Não sou sofredora. Mas precisa ser, tá me entendendo? Sim e não... Você devia estar feliz por eu não sofrer, me incentivar a continuar assim, eu estou bem. Não não não, sofre, coloca música do Roupa Nova aí. Roupa Nova é patético. Mas serve pra sofrer... Dona consciência, eu vou ser bem sincera, nada contra a senhora, nem nada, até te acho bem legal me forçando a sofrer e tal, eu vivo disso, eu sei, mas eu to bem... Depois de muitos anos, servindo de escrava do amor, eu decidi virar o jogo, o amor me encarcerou por tanto tempo que eu tinha esquecido como o sol era bonito. Você tem noção da beleza que é acordar de manhã sem ter chorado pra dormir? Eu descobri um amor lindo, consciencinha... Eu descobri que me amar vale a pena demais. Ah não, vai me dizer que você tá levando a sério aquele papinho feminista de "vou me amar, sou autosuficiente e blábláblá", você não é dessas Thais, você nasceu pra sofrer! Você que pensa,  consciencia... Eu nasci foi pra ser feliz. Passei muito tempo achando que era feliz, sofrendo, jurando que aquilo era felicidade, sabe? É bonito sofrer por amor, é lindo. Comove as pessoas, dá gosto de falar "ela morre de amor, ela chora, ela sente dor", mas isso também enjoa. É isso! Eu enjoei. Eu cansei, cansei mesmo, to cansada da Silva. To afim de ser feliz, to afim de ser leve, será que tá dificil? Então vamos fazer assim, eu não sofro mais e tento falar sobre felicidade, será que ninguém gosta de ser feliz? E se não der certo? Ah se não der certo eu não to nem aí, eu vou comprar um vestido florido, vou botar meu chinelo e vou sair por aí sorrindo. Eu vou inventar uma nova piada e vou rir sozinha. Eu vou fugir com o circo e virar palhaça. Eu quero viver de riso, quero viver do amor de verdade. Eu não aceito mais esse negócio de sofrer e não aceito mais quem me queira pra sofrer. Se for pra me ter hoje, vai me ter assim, feliz. E eu te juro, dona consciência, só me entrego ao amor de novo, se for pra chorar, mas pra chorar muito, mas pra chorar pra valer, de verdade, eu aceito se for pra chorar de tanto rir.




segunda-feira, 28 de maio de 2012

O último texto.


(Ler ouvindo L'Aventura - Legião Urbana)



Essa é a ultima vez que vai ler um texto sobre você. Eu decidi que seria uma despedida, um velório, uma forma de enterrar esse amor morto que eu insisti em ressuscitar tantas vezes. Dessa vez eu vou falar de mim, eu vou falar das flores, do meu jardim que agora tem orquídeas novas, do meu peito que já brotaram tantos nomes diferentes depois do seu. Nossa cama não é mais nossa, nem a nossa música me comove mais. Pra dizer a verdade, acho que nunca comoveu, nunca gostei de fato dela. Eu sempre mórbida, triste, melancólica demais prum sentimento tão bonito quanto o meu foi. Pra continuar dizendo bem a verdade, meu peito já se libertou de você e faz um tempão, é... há muito tempo eu já parei de chorar. Enjoa ter que ouvir as pessoas dizerem que vai passar e que você está melhor assim e eu estou melhor assim e está tudo melhor assim. Enjoa olhar pras pessoas e lembrar de você, ver casais e relembrar nossos momentos, que não foram assim tão bons. Chega uma hora que o o sofrimento pede arrego e você tem que dar lugar pra renovação. O novo chega e pede espaço. Um novo amor, nova casa, nova profissão, um novo você. Eu apaguei seus e-mails faz tempo. Mas a vontade de sofrer por amor virou moda e eu entrei nessa. Sofri tanto que enjoei. Por isso decidi fazer um último texto pra te dizer que não sofro mais. Pra te dizer que nossos planos foram superados faz tempo e que te quero bem. Não quero mais pra mim, mas também não quero o mal. Quero que lembre de mim, não por sofrer e nem porque é moda. Mas quero que lembre porque fomos importantes um pro outro. Quero que me perdoe de tudo que foi pesado, de tudo que foi triste, que foi perdido. E que venha o novo, pra você também. Quero que a minha leveza seja sua. Depois de tanto choro vazio, sem esperança, sem ao menos sentimento, eu escrevo nossa despedida sorrindo. Não misture apego ou remorso com amor, assim como eu fiz. Nosso amor foi lindo, sim e durou o quanto bastava, não existe mais e hoje em dia é só lembrança. Trata de ficar bem e ser feliz, isso é obrigação da gente. Ri hoje, lembrando de te explicar que  "a", usado como prefixo, significa "não" ... De manhã, naquele trânsito infernal da marginal, ouvindo mpb, tentando fugir do caos, isso me veio a mente. 
Morrer.
Amor. 
Amor é o começo de não morrer. 
Amorrer. 
Amar é sobreviver. E a gente amou, a gente sobreviveu.

terça-feira, 22 de maio de 2012

Sol.


(Ler ouvindo Jeremy Camp - My Desire)


Eu nunca fui de pedir muito, o Senhor sabe, sou orgulhosa até pra orar. Hoje eu queria pedir Sol. E não tem problema se chover, se ficar nublado, ou se der aquelas ventanias que me assustam desde menina, eu só quero um pouco de luz. Tenho tido dias difíceis, na maioria dos dias tenho dormido antes de conseguir orar, Te juro que não é por mal, é cansaço. Cabeça cansada, corpo cansado e a vida não para né? Quando tenho um tempinho, desligo a música e falo com o Senhor. Mas é sempre pouco tempo e eu falo muito, não tem jeito, sempre esqueço de algo. Obrigada pela paciência dos últimos tempos, apesar da fase  ruim, obrigada pela calma que tenho tido. Não tenho sido boa filha, nem boa irmã, nem boa amiga e isso me frustra, sou perfeccionista demais. Tenho tido medo, Pai, muito medo. Medo às vezes, do que nem conheço, do que nunca me fez mal, tenho tido medo da vida. Fiz mal pra pessoas que não mereciam e não fiz por querer, mas agora não sei como reparar. As pessoas são cruéis, cruéis a um nível que nunca tinha percebido, há nos seres humanos uma certa irracionalidade que me deixa triste. Triste a um nível que eu também nunca tinha percebido como é possível ficar. Por isso me deixei apagar, saí desse monte de besteiras. Tenho sido vã. Tenho vivido como se a vida fosse pra sempre e eu pudesse simplesmente me desligar um pouco e esperar que tudo passe. Tenho relevado coisas que não deveria. Tenho sido omissa. É que ando sem forças. Por isso queria te pedir hoje, bastante Sol. Sol que me de vontade de sair e sorrir e gostar de novo das pessoas. Sol que ilumine a minha fé. Eu quero um Sol que ponha luz sobre todos os problemas escuros que tenho tido. Eu quero um Sol que esquente todo esse frio em mim. Eu tenho medo de me tornar alguém triste. E lá vou eu falando de medo de novo... Eu tenho medo, Pai. Eu não quero ser triste, nem fria, eu não quero ser mais alguém que sofreu e morreu por dentro. Eu quero Sol. E se não for  pedir muito, cuide de todos aqueles que já pediram ao Senhor por mim, mesmo que eu não saiba o nome deles. Todos que vivem com amor e por amor nessa vida bagunçada da gente aqui embaixo. Que as alegrias cheguem e que as tristezas sejam esquecidas, que a paz reine e que o amor sobreviva. 
Que nada me sufoque e que a maré baixe. Sol, Pai é só isso que eu te peço.
Amém.

sexta-feira, 4 de maio de 2012

Cinza.


       (Ler ouvindo Passerà - Renato Russo)

Se existe algo mais triste do que sofrer, sem dúvida nenhuma é não sofrer. Não sentir, não ter qualquer espirro de afeto ou desafeto ou de qualquer coisa. Não sentir é de um tédio que nunca acaba. As pessoas tem todas a mesma cor, cinzas. Elas aparecem na minha frente como num circo, fazem sua apresentação e saem. Cinzas. As vezes meia dúzia de palmas, bocejo, um sorriso de canto, bocejo. Sono. De noite, o sono desparece, parece que quando estou sozinha as pessoas fazem sentido, lá longe. Elas tem graça, tem charme, tem potencial. Mas de perto... puft. Some tudo, fica tudo cinza, tudo sem graça, tudo sem cor. Elas falam e o som parece sempre o mesmo. Barulho. Eu aceno com a cabeça e concordo. Discutir causaria mais barulho. A indiferença nos eleva a um plano externo da vida comum. Uma vida dupla, quase. O corpo e a mente vivem em paralelo. Enquanto o corpo convive com tudo, concorda, respira, anda, até conversa as vezes. A mente enxerga tudo isso com repulsa, com vertigem. Enxerga de muito distante, como se não quisesse ao menos chegar perto desse cinza todo. A família a gente até revela, tem toda aquela coisa que a gente aprende desde criança. Respeito, eu acho. Mas não chega perto de ser sentimento. Nem perto. Os homens tem aquele mesmo cheiro, todos. Cheiro de carne, cheiro de açougue. Muda o tamanho, a raça, o jeito, o tom de voz, as vezes. Mas a ladainha é sempre a mesma. Amor, amor, amor, amor. Acho graça quando falam de amor. A mesma graça que eu achava quando meu avô vinha me contar aquelas histórias folclóricas, que ele ouvia na infância dele. Acho que é isso mesmo, amor é igualzinho folclore. A gente escuta falar desde pequena, quando cresce vê que não é nada daquilo, mas não consegue desacreditar completamente. Eu nunca acreditei. Nem em folclore, nem em amor. Acho que esse é meu problema. Nunca acreditar em nada. Lembro do meu avô dizer que metade do folclore precisa que a gente feche os olhos e acredite. A outra metade é verdade, ele jurava. Eu fecho os olhos, abro com medo de achar tudo colorido em volta e a vida continua cinza. Meu avô não era cinza, ele era branco. Tinha os olhos bonitos, de quem já olhou muita coisa. Até que chegou um dia, que ele fechou os olhos, não abriu mais e ficou cinza também. Ficou igual a todo mundo. Ele dizia que eu era a menina mais sensível que ele já tinha visto. Una ragazza sensibile. Acho é que ele estava certo. Todo mundo tem a mesma sensibilidade que ele, depois que ficou cinza. Sensibilidade nenhuma. E se ninguém sente nada, o que eu sinto é o reflexo desse vazio. Alguém que sente o vazio é mesmo alguém sensível demais, piccolina. E aonde Deus entra nisso, vô? Sei lá, vai ver ele ficou cinza também.

quinta-feira, 12 de abril de 2012

O salva-vidas.



    (Ler ouvindo Eu te amo- Chico Buarque)

Eu nunca consegui conviver com a simplicidade do sentimento. Nunca consegui me deixar levar pelo simples. O óbvio, o natural. Sempre fui o avesso, a controvérsia, a exceção, a ovelha desgarrada do rebanho, a louca que nada contra a maré. A louca que nunca admitiu ser amada. Nunca se permitiu, se deixou levar. Será amor, perder o controle? Essa bobagem de ficar cego e rindo pras paredes, nunca me impressionou. Nunca me interessou. Eu sempre esperei mais. Sempre exijo mais. Até que você apareceu, rindo a toa, falando com o canto da boca e não me deixando brechas. Não me dando escolha, não me deixando ar. Quando me senti sufocar, você me salvou. Com aquele sorriso confiante no rosto, de quem já passou por todos os medos do mundo e venceu. Aquela mão que me segurou firme. Nos seus olhos meio verdes, meio amarelos, meio transparentes eu entendi que amor existia. Eu entendi que amor não tinha nada a ver com ficar cego, nem com viveram feliz pra sempre. Amar é salvar. Amar é estender a mão e tirar a pessoa do escuro. Amar é mostrar a luz. Quanto mais eu te pedia pra chegar mais perto, pra me mostrar mais luz, mais amor, vem cá, vem, mais você encostava no meu colo e me pedia pra te ensinar a falar. Lia meus lábios e copiava as palavras. Feito criança, absorvia as palavras, as histórias, as experiências. Você me salvou, você disse um dia em que eu te mostrava livros de um escritor francês. Amar é salvar. Todos nós temos um escuro. Um medo, um monstro dentro do armário, você sorria enquanto as palavras brotavam do canto da sua boca, meio torta, desenhada. Aí vem o amor e nos mostra como enfrentar. Como vencer. O resto, a gente inventa, a gente não é igual a eles. A gente vai ultrapassar o pra sempre. Essa foi a sua frase que mais me marcou. A frase que me fez dormir abraçada na minha blusa, sentindo seu cheiro quando você foi embora. A frase que esmurrou meu peito, que me inspirou pra tantos textos. Você foi embora e acabou. Achei que ia morrer, mas sobrevivi. E quem morre de amor? Amor é salvação e não morte, eu entendi depois de um tempo. To escrevendo dessa vez é pra dizer que estou amando de novo. Amor diferente, eu confesso. Mais racional, sem todo aquele encanto do primeiro. Mas o amor voltou, pra mim. Ele decidiu me dar mais uma chance. E to feliz, sabe? To me amando muito, to amando a nova vida. E eu que achava que nunca mais ia usar essa palavra. Você me salvou, você me ensinou. Do seu jeito torto, meio rindo demais, com piadas e tênis velhos. Você sempre vai ser o meu salva-vidas. O meu redentor, eu diria e você riria sem graça. Hoje eu entendo cada palavra sua, cada gesto. Não existe dor, não existe mágoa. Amor não permite isso. E o resto eu inventei, a gente inventou. Porque hoje eu entendo, hoje eu sei. Nós não somos iguais a eles. 

segunda-feira, 26 de março de 2012

Conselhos (Parte II)



(Ler ouvindo Maria Rita - O que é o amor?)

Olá classe! Sentiram saudade? Ok, não precisam responder. Vamos ao que interessa. Hoje nos vamos falar sobre o bicho de sete cabeças. O monstro do lago Ness. O terrível, temível, horripilante e assustador A-M-O-R. Anotem com a canetinha colorida, no título: O que é o amor? O amor, minhas lindas, nada mais é do que o seu amor próprio refletido em alguém. Amor significa espelho. Simples assim. Grifem isso. Pra amar alguém, é preciso primeiro se amar. Aí vocês vêm pra mim chorando, descabeladas, com a roupa suja de sorvete da noite de fossa anterior gemendo que amam o fulano mais do que tudo e que ele é a vida de vocês. Acorda pra vida, minha filha! Acorda pra realidade, isso aqui não é Matrix, muito menos conto de fadas. Pra amar alguém, é necessário que você se goste em primeiro lugar. E se está faltando amor próprio, já descarta a possibilidade de amor. Pronto, risca da lista. Pode ser paixão, atração, desespero, carência, loucura, pode ser tudo. Tudo. Mas amor não é. Agora uma de vocês vai pensar: “Como ela pode ter certeza que não é amor?”. Porque é óbvio. Porque o amor foi feito pra fazer bem pras pessoas, pra unir, pra completar. “Amor” que destrói, que diminui, que não acrescenta, tem outro nome. E tem outro final também. Isso não quer dizer que amor seja eterno, seja até o final da vida, seja até ficar velhinho e de mãozinha dada, nada disso! Amor é amor. Amor é hoje. Amor é o reflexo de como você se sente hoje. Amar alguém pelo que a pessoa é e pelo que ela é, na sua vida. As pessoas mudam. Acreditar em amor eterno é se prender em rotina. Amor eterno é o mesmo que ler Shakespeare. È lindo, mas é ficção. Amor é todo dia. É rotina. É quebra de rotina. Amor é a paz de espírito que você encontra perto da pessoa. Não importa se é um relacionamento longo, curto, distante, grudado, calmo, violento ou gay. O importante é a paz. Esse papo de pessoa ideal, pessoa que te combina, metade da laranja, simpatia e amarração é perda de tempo. È atraso. Vai cuidar de você, vai ser feliz. Amor próprio é o amor mais bonito. Quando o seu amor próprio encontrar abrigo em outro peito, aí você pode chamar de Amor. Com letra maiúscula. Pode falar com a boca cheia, todas as letras. Porque quando é assim, é concreto. Não é amorzinho idealizado, nem de infância, nem de verão, nem platônico. É real. E não tem problema se acabar amanhã, ou se durar cinqüenta anos. Não vai ter morte. Amor assim, é um marco na vida. E a gente aceita ele, do jeito que for. Sem se prender a datas, promessas, compromissos e convenções. Com a intensidade e duração que for necessário. Agora vamos parar de mistificar tanto o amor, vamos parar de por tanta lenha num fogo tão baixo. Não tem mistério, não tem segredo. Amor é o que te fizer bem. E não importa se é amor próprio, amor a profissão, amor a solidão, amor ao próximo, amor ao filho, amor a vida. O importante é ter amor. Saudável. Chega de colocar o amor num pedestal, num alcance tão longe, o amor mora ao lado, mora dentro, mora junto com a gente. Chega de dar tanto valor a um sentimento que não se força, que não se pede e não se adquire tentando. Amor só acontece, quando a gente cansa de procurar o homem dos sonhos e decide seguir aquele clichê, de toda mulher triste “Vou cuidar de mim”. O amor é cuidar de si, na outra pessoa. Porque cuidando dela, você cuida de você. Por hoje é só, meninas. Por favor, pensem nisso. Chega de chamar qualquer paixonite de show da Ivete de amor. Quem ama loucamente, não ama! Grifem isso com caneta colorida. Se cuidem, pensem, reflitam e amem, mulheres. Amem a si mesmas, amem os outros.
E amém.

quinta-feira, 8 de março de 2012

Encontro.



(Ler ouvindo Caetano Veloso - Você não me ensinou a te esquecer)



Foi numa manhã de sábado. Eu de pijama, você vestindo a esperança nos olhos. A única coisa que eu queria era que aquilo acabasse logo. Eu menti, ok, menti sim, menti mesmo. Eu não estava afim, era brincadeira, não me olha assim - eu pedi sem te olhar. Quando olhei, vi o mundo nos seus olhos. O mundo que eu queria, o mundo que eu fingia que não me importava, quando te deixava sozinho e voltava pra minha vida, sem me preocupar se você ficava bem. Você procurava nos meus olhos, a menina que tinha te dado tudo, que tinha te ensinado o beabá. A menina que te transformou em homem, e agora se recusava assumir o lugar ao seu lado. Eu procurava uma saída. Uma fuga. Um jeito de não te matar, mas de não morrer. A cruz, a espada. O peso de todo aquele tempo arrastado, do sentimento, a vontade de ficar perto e fugir ao mesmo tempo. Eu não posso ficar, menino. Eu menti, eu te enganei. Eu soluçava. Aquela menina não existe, não tem magia, a princesa na verdade era a bruxa. Foi tudo mentirinha. O salgado das lágrimas, na boca. Tenta entender, eu não devia ter te deixado vir aqui. Vai embora, volta pro que é teu. Você é minha – e uma lágrima brotou no teu olho. Não faz isso comigo, eu esqueço tudo, a gente esquece, começa hoje. Vai ser novo, vai ser bom, eu quero saber quem é você. Eu não posso amar alguém que eu não conheço, então eu preciso conhecer, porque eu te amo. Naquela hora, as lágrimas tomaram meus olhos e eu não te enxerguei chegando mais perto, quando eu vi, os braços de salva-vidas já estavam em volta de mim e eu não podia fugir. Eu desabei. Fechei os olhos e lembrei de tudo. Quando ligava trêmula de madrugada. O que aconteceu? Nada, só conversa comigo, faz uma piada, me conta alguma coisa? E você ria. E contava. Piadas péssimas. E me fazia rir com o jeito que se desculpava pelas piadas péssimas.Você tentando me conquistar, oferecendo rios e oceanos. Os sonhos que você dizia que tinha, com nós dois casados só pra poder tocar no assunto. Ali eu vi que não podia fugir. A teia era pra você, mas quem se prendeu fui eu. Quem se perdeu fui eu. Uma última tentativa, eu vou embora, eu não posso ficar, um empurrão, a menina sem sentimento. Te olhei nos olhos e de novo, você venceu. Você ganhou. Você me tem. Você vê isso? Quanto mais fuga, mais prisão. Você me beijou e me puxou pro seu colo. Vem cá, menininha teimosa, para de tentar escapar, seu lugar é aqui, comigo. Seu lugar sou eu. Ali você jurou que era pra sempre, eu concordei. Não foi. Na prática, a teoria sumiu. Você fraco demais, eu dona demais. Mas foi bom. Foi a sensação de impotência diante de alguém tão simples, que me fascinou. Você continua simples, eu continuo fascinada. Mas não deu. Era muito fogo e pouca lenha.
Não era encontro, era desencontro. Era o fim disfarçado de começo.


segunda-feira, 27 de fevereiro de 2012

Eu quero e ponto.



                             (Ler ouvindo Lisbela - Los Hermanos)


Minha vida sempre foi feita de pontos finais. Frases curtas. Começo, meio e fim. Ou só começo e fim. Ou mesmo, só fim. Mas tudo sempre acabou, fácil demais. Rápido. Eu te amava ontem, mas hoje eu não amo e pronto. E ponto. E fim. Todo meu peso de ser dona de mim, fez com que me tornasse uma perita em despedidas. Expert mesmo, de já conhecer a hora de chorar, de abraçar, de dizer as últimas palavras e já não engasgar com o silêncio da volta pra casa. Eu aprendi a perder, por entender que nem sempre ganhar vale a pena. Por não acreditar em fadas, duendes ou em amor eterno. Por não esperar muito de ninguém. Por ser curta e fria. Mas lá dentro, lá no fundo, lá no meu âmago mais escondido tudo que eu queria era algo que não tivesse ponto final. Sonhar não faz mal, meu avô sempre dizia enquanto fazia a barba e ouvia os números da mega-sena que ele nunca chegou nem perto de ganhar. Eu sonho com algo diferente. Eu sonho com o insonhável. Não quero casa de praia, nem abajur bonito na sala. Nem marido de barba mal feita que se abaixa na porta pra receber nosso filhinho começando andar. Eu quero quebra de regras. Não quero a família ideal, nem aliança no dedo, nem jantares em restaurantes caros no final de semana. Eu quero a bagunça do sentimento. Quero brigar e beijar. Quero daqui trinta anos sentir a mesma vontade. Quero poder falar o que eu quiser, dançar tango de madrugada pela casa. Quero engravidar sem querer e eu mesma pintar o quarto do meu filho. Quero uma foto do homem que eu amar na carteira, daquelas bem feias 3x4 pra quando eu olhar, rir e pensar “Até feio, ele é bonito”. Quero que seja bonito, mas não muito. Quero que me mande ficar quieta e me jogue almofadas, quando eu começar a fazer birra. Quero que ria de mim. Quero que ria comigo. Quero que tenha alguma mania insuportável pra eu poder reclamar no café da manhã. Quero que meu filho tenha o nome do meu avô. Quero aquele sexo com olho no olho, boca na boca, pele na pele, com tesão sobrenatural. Sem hora marcada, sem esconder desejo. Quero o amor na essência dele. Quero a convivência complicada de ser dois. E depois três. Quero parar de acreditar que tudo acaba, mesmo que de fato, acabe. Quero ser chamada de louca, por ter uma vida tão estranha e parecer tão feliz. Eu quero deixar de lado os pontos finais e começar usar vírgulas, reticências, exclamações. Quero algumas interrogações, pra não perder o costume. Quero um pouco de dinheiro e tudo de saúde. Um cachorro que não saiba fazer truques direito e uma empregada com sotaque espanhol. Quero deixar de escrever textos curtos e escrever um livro. Um livro que vou chamar de “Sem fim”. Porque ele vai acabar, mas só na última página.

quinta-feira, 16 de fevereiro de 2012

Calendário


 (Ler ouvindo Flávia Bittecourt - Bambayuque)
                                                    

Todos os dias eu penso em você. Tem dias que eu penso mais, choro um pouco, meço o tamanho da saudade, depois guardo de novo o sentimento todo num pacote e volto a viver. E tem dias que quase não me lembro, que me conformo que foi melhor assim, você está bem assim e eu também fico. Mas hoje é segunda, e segunda é dia de sofrer. Dia de lembrar dos nossos finais de semana na casa de campo dos seus tios, movidos a vinho e macarrão instantâneo. Hoje é dia de programar minha semana. Amanhã vou ver o engraçado, você não conhece ele, mas ele te conhece de tanto me ouvir falar de você. Ele me entende e me faz rir. Pena ser tão menino. Gosto dele nas terças, é um dia depois do dia de depressão e sempre me dá animo pra continuar a semana. Na quarta normalmente não vejo ninguém, às vezes aquele clone seu aparece, o psicopata. Chora e diz que eu devo ser dele, pra sempre. Chora do jeito que você nunca chorou. Outro dia ele apareceu aqui, com flores me pedindo em casamento, eu só consegui ficar olhando pra ele desejando que ele fosse você. Mas não era. Quinta feira eu costumo sair sozinha, espairecer. Traço meus planos, imagino futuro. Gosto da calma que a solidão me dá. Mas lembro também, de como era boa nossa solidão a dois. Sexta é dia do cara legal. Inteligente, com piadas que você nunca nem pensou em fazer, instigante, com aquele cabelo meio bagunçado, riso fácil. Ele me embala na sexta até sábado de manhã. Por mais incrível que pareça é a hora em que mais lembro de você. Todo aquele brilho, aquelas luzes, o barulho, a música, as pessoas encostando em mim me lembram de você dizendo quando nos conhecemos “Eu gosto do jeito que você não se dá a qualquer situação”. E agora eu me dou. Dou porque não tenho mais o que perder, nem o que ganhar, nem o que gostar. Dou porque dar é pior do que fazer amor, mas é melhor do que dormir sozinha. Dou porque me dei toda pra você e você me devolveu dizendo que não queria mais. Sábado é o dia de beleza, dia de te fazer ter vontade de se matar por ter me largado, ou pelo menos é isso que eu gosto de imaginar. Compro roupas, faço as unhas, batons, máscaras, chapéus, cabelos, cintos, tristeza, mais roupas, angústia, escova progressiva, saudade. Saudade. Sábado eu sempre durmo sozinha, porque é o dia em que você dormia na minha cama, porque não dava tempo de voltar pra sua casa a noite e sempre estendíamos o jantar e a conversa e o tapete da sala e os beijos e acabávamos dormindo.Eu acordava de madrugada com você me carregando, me levando pra cama falando baixinho “Não acorda não, senão não te carrego mais e você vai andando”. Eu fechava os olhos e sorria. Domingo é dia da família, dia de lembrar do pesadelo da cobrança. De novo, tia, estou solteira de novo. Dia da melhor lasanha da mamãe, das piadas de cinqüenta anos do papai, da ausência da sua mão na minha no sofá duro da casa da vovó. Domingo é dia da embriaguez solitária. Bebo até dormir. Não quero ter tempo pra chorar, nem me lamentar. Nem te ligar desesperada, implorando por uma migalha, socorro, vem me salvar. Mas eu durmo. Durmo, porque quando eu durmo assim, eu sempre sonho com você. E quando eu sonho, você não é mais o cara que me deixou. Você é o cara que me ama, e que quer se casar e acha lindo meu sorriso de canto, quando fico sem jeito. Aí eu acordo segunda, com dor de cabeça e uma tristeza que nada dá jeito. Porque você foi embora e não volta. Porque a minha vida continuou, mas é tudo mentirinha, é tudo disfarce, todo mundo é remendo pro buraco que você deixou. Toda a vida é uma mentira pra ver se eu acredito que sou feliz. Todo dia é dia de lembrar que eu te amo e não tem jeito. Todo dia é a esperança de você chegar e me tirar da rotina que eu odeio, mas que eu finjo que gosto que é pra você não me achar boba nem louca. Eu sinto saudade. É só isso, me perdoa ter ligado, mas tinha sobrado muita bebida de ontem e eu estou sem sono. 
Boa noite...

quinta-feira, 9 de fevereiro de 2012

Descompromisso.


(Ler ouvindo Aqui - Ana Carolina)

A gente simplesmente não se solta. Deveria, poderia, conseguiria, mas não faz. O sentimento é torpe, a vontade é mútua, o desejo é calmo. Não há possibilidade de progresso, mas não existe volta. Outro dia deitada na cama, nós dois conversando, como sempre, aquele assunto que nunca acaba, aquela voz que nunca cansa, nossa disputa pessoal, nossa discussão pelo nada, eu te falei que era triste o nosso fim. Eu não estava te olhando, mas sei que você esboçou aquele sorriso falso, que você dá quando te surpreendo e foi categórico na réplica “Ou não”. Eu só ri e mudei de assunto. Eu sei do teu amor, meu bem. Eu sei do teu ódio também. Enxergo ele todo dia, na sua dificuldade em me ignorar. Eu consigo te afetar num ponto que ninguém mais chega. A nossa vontade de se bater e beijar ao mesmo tempo. O carinho e o tapa. Paixão. Desprezo. Uma vontade de chegar perto e empurrar ao mesmo tempo.Essa vontade de te esganar constante pra logo depois beijar as marcas dos dedos no teu pescoço. Você me jurando que é amor, eu rindo do jeito que te faz rir. Eu não acredito em amor, garoto. Não me obriga a sentir. Não faz  da nossa relação, obrigação. Acredito que estamos aqui, juntos, por um motivo claro e simples: rotina. Eu me acostumei ao seu jeito meio grosso, as suas palavras meio tortas, o seu humor inabalável, sempre negro. Você se acostumou a minha fraqueza misturada com independência, minha ironia, minha mania de sempre perguntar o porquê de tudo, da roupa ainda estar no varal ou das crianças passarem fome na África. Sua paciência, meu choro. A saudade de uns dias longe, acabou, vamos parar, isso é atraso de vida, nós estamos perdendo tempo e a vontade ridícula de me fingir de telemarketing e te oferecer planos de saúde, revistas, camisetas, minha alma, qualquer coisa. Em parcelas suaves, só põe a mão no bolso daqui trinta dias. E você dizer não, daquele jeito polido que você trata os estranhos. Não, não quero, não me interesso, não faria uso. Eu precisava ouvir. Não me quer, não te interessa, não faria uso, eu precisava por aquilo na cabeça. Eu precisava da sua voz fraca, calma me dizendo mais uma vez que não dava. Aquela voz que você usou quando disse que era o melhor ficarmos longe, eu te quero bem, menina, vou te ver grande ainda. Frio. E eu chorava, pedia, implorava, não deixa acabar. Não me mata, eu imploro. Eu te amo, sim. Eu acredito no amor, agora. Eu acredito em você, eu quero. Nós nos damos tão bem.Vai dar certo. E você categórico, como sempre “Ou não”. Difícil imaginar a vida sem alguém que dividia tudo que não se divide com ninguém. Difícil, mas não impossível. A amizade ficou. Uma sobra de sentimento, de elo, de ligação. Vital pra nós dois. Eu sempre soube que não seria você, o famoso grande homem da minha vida. Você é despretensioso demais pra um cargo tão sério. Mas você me ensinou a acreditar que amor existe, sim. Não é aquele conto de fadas, nem precisa de promessas de eternidade, nem faço questão de vestido branco, nem casa com cachorro chamado Bob e filhinhos que brincam na sala. Eu só quero sentir. Como eu sentia quando você me chamava daquele apelido ridículo na frente dos outros e ria me olhando. E eu não me importava, porque eu adorava que você quisesse me irritar. Eu sei que somos pra sempre. Eu sei nossa história é feia. Eu sei que você nunca foi tão bonito. Eu sei que você vai sabotar meus namoros e eu vou odiar suas namoradas. Sei que no final, vamos acabar deitados na cama, cantando alguma música antiga que ninguém mais saiba, cansados de tentar fugir desse amor tão sem amor que sentimos e loucos de vontade de nos odiar pra sempre, como sempre foi.