segunda-feira, 27 de fevereiro de 2012

Eu quero e ponto.



                             (Ler ouvindo Lisbela - Los Hermanos)


Minha vida sempre foi feita de pontos finais. Frases curtas. Começo, meio e fim. Ou só começo e fim. Ou mesmo, só fim. Mas tudo sempre acabou, fácil demais. Rápido. Eu te amava ontem, mas hoje eu não amo e pronto. E ponto. E fim. Todo meu peso de ser dona de mim, fez com que me tornasse uma perita em despedidas. Expert mesmo, de já conhecer a hora de chorar, de abraçar, de dizer as últimas palavras e já não engasgar com o silêncio da volta pra casa. Eu aprendi a perder, por entender que nem sempre ganhar vale a pena. Por não acreditar em fadas, duendes ou em amor eterno. Por não esperar muito de ninguém. Por ser curta e fria. Mas lá dentro, lá no fundo, lá no meu âmago mais escondido tudo que eu queria era algo que não tivesse ponto final. Sonhar não faz mal, meu avô sempre dizia enquanto fazia a barba e ouvia os números da mega-sena que ele nunca chegou nem perto de ganhar. Eu sonho com algo diferente. Eu sonho com o insonhável. Não quero casa de praia, nem abajur bonito na sala. Nem marido de barba mal feita que se abaixa na porta pra receber nosso filhinho começando andar. Eu quero quebra de regras. Não quero a família ideal, nem aliança no dedo, nem jantares em restaurantes caros no final de semana. Eu quero a bagunça do sentimento. Quero brigar e beijar. Quero daqui trinta anos sentir a mesma vontade. Quero poder falar o que eu quiser, dançar tango de madrugada pela casa. Quero engravidar sem querer e eu mesma pintar o quarto do meu filho. Quero uma foto do homem que eu amar na carteira, daquelas bem feias 3x4 pra quando eu olhar, rir e pensar “Até feio, ele é bonito”. Quero que seja bonito, mas não muito. Quero que me mande ficar quieta e me jogue almofadas, quando eu começar a fazer birra. Quero que ria de mim. Quero que ria comigo. Quero que tenha alguma mania insuportável pra eu poder reclamar no café da manhã. Quero que meu filho tenha o nome do meu avô. Quero aquele sexo com olho no olho, boca na boca, pele na pele, com tesão sobrenatural. Sem hora marcada, sem esconder desejo. Quero o amor na essência dele. Quero a convivência complicada de ser dois. E depois três. Quero parar de acreditar que tudo acaba, mesmo que de fato, acabe. Quero ser chamada de louca, por ter uma vida tão estranha e parecer tão feliz. Eu quero deixar de lado os pontos finais e começar usar vírgulas, reticências, exclamações. Quero algumas interrogações, pra não perder o costume. Quero um pouco de dinheiro e tudo de saúde. Um cachorro que não saiba fazer truques direito e uma empregada com sotaque espanhol. Quero deixar de escrever textos curtos e escrever um livro. Um livro que vou chamar de “Sem fim”. Porque ele vai acabar, mas só na última página.

quinta-feira, 16 de fevereiro de 2012

Calendário


 (Ler ouvindo Flávia Bittecourt - Bambayuque)
                                                    

Todos os dias eu penso em você. Tem dias que eu penso mais, choro um pouco, meço o tamanho da saudade, depois guardo de novo o sentimento todo num pacote e volto a viver. E tem dias que quase não me lembro, que me conformo que foi melhor assim, você está bem assim e eu também fico. Mas hoje é segunda, e segunda é dia de sofrer. Dia de lembrar dos nossos finais de semana na casa de campo dos seus tios, movidos a vinho e macarrão instantâneo. Hoje é dia de programar minha semana. Amanhã vou ver o engraçado, você não conhece ele, mas ele te conhece de tanto me ouvir falar de você. Ele me entende e me faz rir. Pena ser tão menino. Gosto dele nas terças, é um dia depois do dia de depressão e sempre me dá animo pra continuar a semana. Na quarta normalmente não vejo ninguém, às vezes aquele clone seu aparece, o psicopata. Chora e diz que eu devo ser dele, pra sempre. Chora do jeito que você nunca chorou. Outro dia ele apareceu aqui, com flores me pedindo em casamento, eu só consegui ficar olhando pra ele desejando que ele fosse você. Mas não era. Quinta feira eu costumo sair sozinha, espairecer. Traço meus planos, imagino futuro. Gosto da calma que a solidão me dá. Mas lembro também, de como era boa nossa solidão a dois. Sexta é dia do cara legal. Inteligente, com piadas que você nunca nem pensou em fazer, instigante, com aquele cabelo meio bagunçado, riso fácil. Ele me embala na sexta até sábado de manhã. Por mais incrível que pareça é a hora em que mais lembro de você. Todo aquele brilho, aquelas luzes, o barulho, a música, as pessoas encostando em mim me lembram de você dizendo quando nos conhecemos “Eu gosto do jeito que você não se dá a qualquer situação”. E agora eu me dou. Dou porque não tenho mais o que perder, nem o que ganhar, nem o que gostar. Dou porque dar é pior do que fazer amor, mas é melhor do que dormir sozinha. Dou porque me dei toda pra você e você me devolveu dizendo que não queria mais. Sábado é o dia de beleza, dia de te fazer ter vontade de se matar por ter me largado, ou pelo menos é isso que eu gosto de imaginar. Compro roupas, faço as unhas, batons, máscaras, chapéus, cabelos, cintos, tristeza, mais roupas, angústia, escova progressiva, saudade. Saudade. Sábado eu sempre durmo sozinha, porque é o dia em que você dormia na minha cama, porque não dava tempo de voltar pra sua casa a noite e sempre estendíamos o jantar e a conversa e o tapete da sala e os beijos e acabávamos dormindo.Eu acordava de madrugada com você me carregando, me levando pra cama falando baixinho “Não acorda não, senão não te carrego mais e você vai andando”. Eu fechava os olhos e sorria. Domingo é dia da família, dia de lembrar do pesadelo da cobrança. De novo, tia, estou solteira de novo. Dia da melhor lasanha da mamãe, das piadas de cinqüenta anos do papai, da ausência da sua mão na minha no sofá duro da casa da vovó. Domingo é dia da embriaguez solitária. Bebo até dormir. Não quero ter tempo pra chorar, nem me lamentar. Nem te ligar desesperada, implorando por uma migalha, socorro, vem me salvar. Mas eu durmo. Durmo, porque quando eu durmo assim, eu sempre sonho com você. E quando eu sonho, você não é mais o cara que me deixou. Você é o cara que me ama, e que quer se casar e acha lindo meu sorriso de canto, quando fico sem jeito. Aí eu acordo segunda, com dor de cabeça e uma tristeza que nada dá jeito. Porque você foi embora e não volta. Porque a minha vida continuou, mas é tudo mentirinha, é tudo disfarce, todo mundo é remendo pro buraco que você deixou. Toda a vida é uma mentira pra ver se eu acredito que sou feliz. Todo dia é dia de lembrar que eu te amo e não tem jeito. Todo dia é a esperança de você chegar e me tirar da rotina que eu odeio, mas que eu finjo que gosto que é pra você não me achar boba nem louca. Eu sinto saudade. É só isso, me perdoa ter ligado, mas tinha sobrado muita bebida de ontem e eu estou sem sono. 
Boa noite...

quinta-feira, 9 de fevereiro de 2012

Descompromisso.


(Ler ouvindo Aqui - Ana Carolina)

A gente simplesmente não se solta. Deveria, poderia, conseguiria, mas não faz. O sentimento é torpe, a vontade é mútua, o desejo é calmo. Não há possibilidade de progresso, mas não existe volta. Outro dia deitada na cama, nós dois conversando, como sempre, aquele assunto que nunca acaba, aquela voz que nunca cansa, nossa disputa pessoal, nossa discussão pelo nada, eu te falei que era triste o nosso fim. Eu não estava te olhando, mas sei que você esboçou aquele sorriso falso, que você dá quando te surpreendo e foi categórico na réplica “Ou não”. Eu só ri e mudei de assunto. Eu sei do teu amor, meu bem. Eu sei do teu ódio também. Enxergo ele todo dia, na sua dificuldade em me ignorar. Eu consigo te afetar num ponto que ninguém mais chega. A nossa vontade de se bater e beijar ao mesmo tempo. O carinho e o tapa. Paixão. Desprezo. Uma vontade de chegar perto e empurrar ao mesmo tempo.Essa vontade de te esganar constante pra logo depois beijar as marcas dos dedos no teu pescoço. Você me jurando que é amor, eu rindo do jeito que te faz rir. Eu não acredito em amor, garoto. Não me obriga a sentir. Não faz  da nossa relação, obrigação. Acredito que estamos aqui, juntos, por um motivo claro e simples: rotina. Eu me acostumei ao seu jeito meio grosso, as suas palavras meio tortas, o seu humor inabalável, sempre negro. Você se acostumou a minha fraqueza misturada com independência, minha ironia, minha mania de sempre perguntar o porquê de tudo, da roupa ainda estar no varal ou das crianças passarem fome na África. Sua paciência, meu choro. A saudade de uns dias longe, acabou, vamos parar, isso é atraso de vida, nós estamos perdendo tempo e a vontade ridícula de me fingir de telemarketing e te oferecer planos de saúde, revistas, camisetas, minha alma, qualquer coisa. Em parcelas suaves, só põe a mão no bolso daqui trinta dias. E você dizer não, daquele jeito polido que você trata os estranhos. Não, não quero, não me interesso, não faria uso. Eu precisava ouvir. Não me quer, não te interessa, não faria uso, eu precisava por aquilo na cabeça. Eu precisava da sua voz fraca, calma me dizendo mais uma vez que não dava. Aquela voz que você usou quando disse que era o melhor ficarmos longe, eu te quero bem, menina, vou te ver grande ainda. Frio. E eu chorava, pedia, implorava, não deixa acabar. Não me mata, eu imploro. Eu te amo, sim. Eu acredito no amor, agora. Eu acredito em você, eu quero. Nós nos damos tão bem.Vai dar certo. E você categórico, como sempre “Ou não”. Difícil imaginar a vida sem alguém que dividia tudo que não se divide com ninguém. Difícil, mas não impossível. A amizade ficou. Uma sobra de sentimento, de elo, de ligação. Vital pra nós dois. Eu sempre soube que não seria você, o famoso grande homem da minha vida. Você é despretensioso demais pra um cargo tão sério. Mas você me ensinou a acreditar que amor existe, sim. Não é aquele conto de fadas, nem precisa de promessas de eternidade, nem faço questão de vestido branco, nem casa com cachorro chamado Bob e filhinhos que brincam na sala. Eu só quero sentir. Como eu sentia quando você me chamava daquele apelido ridículo na frente dos outros e ria me olhando. E eu não me importava, porque eu adorava que você quisesse me irritar. Eu sei que somos pra sempre. Eu sei nossa história é feia. Eu sei que você nunca foi tão bonito. Eu sei que você vai sabotar meus namoros e eu vou odiar suas namoradas. Sei que no final, vamos acabar deitados na cama, cantando alguma música antiga que ninguém mais saiba, cansados de tentar fugir desse amor tão sem amor que sentimos e loucos de vontade de nos odiar pra sempre, como sempre foi.